A CHEGADA DOS CISTERCIENSES


Desde 1936 o então abade de Schlierbach, Dom Aloísio Wiesinger, pensava numa fundação missionária, como resposta ao Capítulo Geral da Ordem em 1925. Schlierbach, então, aceitou o novo programa missionário proposto pelo papa Pio XI de expandirem suas missões para fora da Europa. 

O Capítulo de 1925 apoiou sem reservas o programa de missões exteriores em grande escala propiciado pelo Papa Pio XI, e buscou também como uma comunidade monástica poderia realizar atividade missionária sem sacrificar suas características básicas. (...) Esta difícil tarefa encontrou um promotor diligente o abade Aloísio Wiesinger de Schlierbach, cujo mosteiro se converteu de imediato ao centro do movimento. O abade informou no Capítulo Geral extraordinário de 1927 sobre o resultado de suas pesquisas, relacionadas com a América do Norte e do Sul, e o trabalho começou de imediato.

Certo dia, estando na Capital Salvador os Padres Alfredo, Adolfo e João Berchmans, vindos de Schlierbach para tomar posse da Paróquia de Jacobina, foram reconhecidos pela Sr.ª Dona Isabel Fernandes Tude de Souza por causa do hábito branco e preto dos Cistercienses. Ela, por sua vez, falou-lhes do Testamento de seu falecido esposo – o Sr. Coronel Plínio Tude de Souza – o qual desejava criar uma Fundação que contemplasse o bem material e espiritual dos lavradores e vaqueiros da Fazenda Jequitibá.

[...] Declaro que tendo eu e minha mulher Dona Izabel Fernandes Tude de Souza nascidos na zona sertaneja, onde possuímos grande parte de nossos bens e onde por anos vivemos contentes e com felicidade, é nosso desejo beneficiar a referida zona, o que ora fazemos neste nosso testamento, criando a "Fundação Divina Pastora". Assim lego à mesma Fundação Divina Pastora, aqui instituída, a fazenda de engorda denominada "Jequitibá", no município de Mundo Novo, com todas as benfeitorias, gado, etc. e tudo mais que nela existir ao tempo de abrir-se a sucessão, para na mesma fazenda ser criada a escola de ensino primário rural [...]. Nesses estabelecimentos exigimos que seja dado o ensino do catecismo e seja ensinada e divulgada a nossa Santa Religião Católica Apostólica Romana, como base primordial da referida Fundação Divina Pastora. [...].

A piedosa viúva convidou então o Padre Alfredo para visitar a Fazenda Jequitibá, o qual achou excelente e propício o lugar para a implantação do referido mosteiro. A princípio foram três os visitantes: Padre Alfredo Haasler, Padre Adolfo Lukasser e Padre João Berchmans Elsen, que já se encontravam na paróquia de Jacobina a convite de Dom Hugo Bressane de Araújo (primeiro Bispo de Senhor do Bonfim/BA).

Inicialmente, D. Hugo, além de ter entregue a Paróquia de Santo Antônio aos padres Cistercienses, havia oferecido também a Igreja da Conceição para ser a futura igreja do mosteiro, pois o bispo achava melhor que os monges ficassem em Jacobina. Porém, no mesmo ano, o próprio abade de Schlierbach, D. Aloísio, chega ao Brasil para acertar os detalhes do empreendimento da novel fundação na região de Jequitibá, pois já haviam se deslumbrado com o lugar. Outro fator levado em consideração pela optação da localidade foi a tradição cisterciense de construir seus mosteiros no campo, na zona rural, para viabilizar o trabalho manual, o silêncio e a fuga mundi.

Pouco depois, atendendo o chamado do abade Aloísio, chegaram os monges pioneiros do Mosteiro de Jequitibá:

  • Padre Hermano Hahn, engenheiro civil que projetou o mosteiro;

  • Padre Antonio Moser, que viria a ser abade do mosteiro a partir de 1945;

  • Padre Reinaldo Stieger;

  • Padre Henrique Bauer;

  • Padre Fridolino Glasauer;

  • Irmão Emílio Weber;

  • Irmão Ubaldo Pusch;

  • Irmão Humberto Stocker;

  • Irmão Werner Hofer.

Dom Alois Wiesinger, O. Cist.
Dom Alois Wiesinger, O. Cist.
D. Hugo Bressane de Araújo
D. Hugo Bressane de Araújo
Plínio Tude & Isabel Tude
Plínio Tude & Isabel Tude
Pe. Alfredo Haasler
Pe. Alfredo Haasler
Pe. Adolfo Lukasser
Pe. Adolfo Lukasser
Pe. João Berchmans
Pe. João Berchmans

A preparação da construção das instalações do novo Mosteiro iniciou oficialmente em 18 de dezembro de 1941, quando o engenheiro Emilio Odebrecht fez uma visita in loco para conhecer o ambiente dos futuros fundamentos, bem como planejar os orçamentos. Dom Aloísio registrou com grande alegria este feito pois, finalmente, D. Isabel havia decidido iniciar as obras das estruturas físicas. Contudo, este ânimo duraria não mais que três meses, quando em 20 de fevereiro de 1942 todos os monges seriam convocados a se apresentarem à polícia de Mundo Novo. Neste período a Segunda Guerra Mundial continuava a marcar a história de Jequitibá. Três meses após responderem à convocação, receberam a visita do delegado de Mundo Novo. Ele havia recebido denúncias de que em Jequitibá haviam espiões de Hitler. 

"Nos visitou o delegado da polícia de Mundo Novo por causa de uma denúncia, que nós padres tivéssemos um canal subterrâneo com estação de rádio. (Canal da transmissão na serraria e carpintaria para movimentar as máquinas)"

A transferência da Pedra Fundamental e uma nova escavação simbólica foi feita pelo Abade em 26 de junho de 1942, um dia após celebrar o seu Jubileu de Prata. Foi uma cerimônia bastante discreta: 

"No domingo [26] foi transferida a 'pedra Fundamental', aquela que há anos foi colocada; novo documento foi redigido, porque o velho estava todo estragado; e feito neste dia a primeira 'Escavação' [...]. Muita gente estava presente, 60 homens e 28 mulheres".

Enquanto isso, a reação alemã com o rompimento de relações diplomáticas realizado por Getúlio Vargas ocorreu em agosto de 1942, quando submarinos alemães torpedearam e afundaram cinco navios mercantes brasileiros. Os ataques indignaram a opinião pública, e Getúlio Vargas declarou guerra à Alemanha naquele mesmo mês. Com o Brasil apoiando os Aliados, a aversão aos alemães ou descendentes tornou-se extrema de tal modo que os monges experienciaram isto intensamente, fosse nas frequentes visitas policiais ou nas reações agressivas que continuaram sofrendo. Certa vez, D. Aloísio, tendo terminado de celebrar a Missa Solene do dia de São Bernardo de Claraval, em Jacobina, quis retornar à Jequitibá e não conseguiu embarcar na locomotiva porque os passageiros o expulsaram.

"Cinco navios comerciais foram afundados na costa do Brasil; por isso, a excitação no país é grande, o ódio contra os 'gringos/estrangeiros' aumenta cada vez mais. Por ocasião da festa de S Bernardo fui em Jacobina, celebrei uma missa festiva lá. Na véspera, ouvimos falar da declaração de guerra a Alemanha. Eu queria voltar de trem para Jequitibá, em vez de ir a Salvador. Não podia: o povo não me deixou viajar no trem, 'me botou pr'a fora'. Viajei a cavalo por Tanquinho, Mucambo e Palmeirinha, tornando-me suspeito como espião, parando-me e interrogando-me. Finalmente deixaram-me continuar a viagem, mas não ousei passar por Mundo Novo, onde também uns horrivelmente 'fermentaram' contra mim. Muito cansado cheguei em Jequitibá na terça-feira, 25 de agosto".

Depois de algumas pausas nos trabalhos da obra devido a estes acontecimentos relativos à II Grande Guerra que também atingiram Jequitibá, a construção foi sendo postergada até que em 21 de dezembro de 1942 recomeçaram e seguiram firmes. Em novembro de 1944 a primeira ala do edifício estava concluído, faltando apenas alguns acabamentos elétricos, pintura e marcenaria. Após três meses, aqueles últimos detalhes foram resolvidos e em fevereiro de 1945 o prédio ficou pronto. A fachada foi feita de pedra para transmitir, por meio de suas linhas, os ideais de austeridade, rigor e simplicidade.

Pe. Antonio Moser assumiu o protagonismo da vida da comunidade monástica como Prior nos primeiros anos e, posteriormente, em 01 de outubro de 1950, tornou-se seu Abade. Desde a sua chegada, foi o responsável pela Fundação Divina Pastora estando à frente do projeto, no governo das mesmas entidades – Mosteiro e Fundação – até 16 de junho de 1996, quando completou seu Jubileu de Ouro de governo e renunciou. Faleceu em 30 de julho de 2003. Ele encontrou uma situação de extrema pobreza em toda a redondeza onde os moradores da Fazenda Jequitibá eram agregados e prestavam serviços gerais de fazenda ao Sr. Plínio Tude.

O que se vê por aqui em geral é um baixo nível cultural, onde ninguém sabe ler e escrever, [...] nem oração em família, nem sentido de tomar as refeições em conjunto, porque os espaços das moradias são insuficientes. Por isso é necessário que as crianças não somente freqüentem a escola, mas recebam um internato para que tenham uma instrução religiosa e familiar. Só assim quando esses ficarem já formados poderão um dia formarem uma família trazendo melhorias nesse sentido; por isso é de máxima importância uma escola com internato para fundamentar um futuro melhor.

As poucas famílias existentes moravam distantes da Sede da Fazenda, no meio dos pastos ou do mato. Em sua maioria, não havia estrada. Eram apenas trilhas de acesso. As casas eram construídas de pau a pique ou de adobe, cobertas com materiais extraídos da natureza, folhas de coqueiro e outros vegetais. Poucos tinham um animal – jegue ou cavalo, para uso doméstico no transporte de compras e produção. Ganhavam pouco e viviam basicamente daquilo que se produzia. Quase nunca compravam roupas porque além da distância da cidade, da precária demanda comercial, não se tinha dinheiro para isto e poucas coisas para fazer troca. Quase todos os moradores da Fazenda eram analfabetos, pois não havia acesso à escola. Havia grande índice de mortalidade infantil por causa do material com que eram construídas as casas, muito propício para os insetos, particularmente, o famoso “Barbeiro”, gerando a Doença de Chagas e morte precoce; ainda hoje há pessoas afetadas.

Tudo isso impulsionou aqueles primeiros monges missionários a assumirem uma inserção social buscando as vias de transformação e trazendo benefícios para a melhoria na qualidade de vida daquelas famílias carentes.

As atividades da comunidade monástica não se concentraram somente em Jequitibá, mas estenderam-se também na região. Haja vista que o Mosteiro prestou serviços religiosos em várias localidades, como por exemplo: Jacobina, Ruy Barbosa, Miguel Calmon, Mairi, Várzea do Poço, Baixa Grande, Piritiba, Tapiramutá e Macajuba. Hoje, os monges atendem regularmente a Paróquia de Jequitibá, formada pela rede de comunidades próximas ao Mosteiro.

Desde o início, a comunidade monástica buscou da melhor forma realizar as aspirações de Plínio Tude, almejando o desenvolvimento do sertão baiano, criando as escolas para a formação das crianças e dos jovens da localidade, assim, cumprindo os objetivos previstos nos Estatutos da Fundação. 

Ginásio São Bernardo

O Mosteiro criou o Ginásio São Bernardo em 1946, que também foi denominado Seminário de Filosofia, tendo em vista preparar futuros jovens para vida e/ou para o sacerdócio. Foi a primeira iniciativa educacional dos monges cistercienses em Jequitibá. Funcionou até 1970, encerrando suas atividades.

Escola Profissional Divina Pastora

Criada com os cursos de carpinteiro, marceneiro, mecânica geral e mecânica de auto. Os alunos moravam numa parte do Mosteiro onde tinham a formação intelectual. As aulas práticas nas oficinas eram realizadas pelos monges. Com a evolução da tecnologia e dificuldades financeiras, tornou-se obsoleta e assim buscou-se uma readequação educacional.

Escola Técnica Família Agrícola Divina Pastora (ETFA-DIP)

Desde 2008, buscando uma adequação aos avanços tecnológicos e à legislação vigente, foi criada e funciona até hoje a ETFA-DIP, de Ensino Médio Técnico em Agropecuária. O ensino é no regime de internato com pedagogia da alternância. São acolhidos jovens da Fazenda Jequitibá, de Mundo Novo e Região.

Escola Santo Antônio

Criada por Dom Antonio Moser logo no início de suas obras e sediada no povoado Estação de Jequitibá. Atualmente o prédio pertence ao Mosteiro, mas está a serviço da Prefeitura Municipal de Mundo Novo. Funciona o que denominamos de creche infantil: a Série Maternal, Pré-1 e Pré-2 do Ensino Primário para as crianças dos povoados Fazenda e Estação.