Sobre o culto às santas relíquias e imagens

08/12/2023

Durante as perseguições contra os cristãos, as relíquias dos santos mártires eram normalmente enterradas pelos fiéis em lugares escondidos. Então, em Constantinopla, perto dos portões e da torre no bairro Eugenius, foram encontrados os corpos de vários mártires. Seus nomes permanecem desconhecidos pela Igreja. Quando milagres de cura começaram a ocorrer neste local, as relíquias dos santos foram descobertos e transferidos para uma Igreja com grande honra. Foi revelado a um clérigo piedoso, Nicholas Kalligraphia, que entre as relíquias descobertas em Eugenius estavam as relíquias do santo apóstolo Andrônico da Panônia, um dos Setenta Discípulos, e sua ajudante Júnias (17 de maio), a quem o apóstolo Paulo menciona na Epístola aos Romanos 16,7. No século XII, uma grande Igreja foi construída no local onde foram descobertas as relíquias dos santos mártires. Este trabalho foi realizado pelo imperador Andrônico (1183-1185), cujo patrono onomástico era o santo apóstolo Andrônico.

A ideia de que a Igreja dos primeiros séculos foi de algum modo preconceituosa contra imagens, ícones, relíquias estátuas é a ficção mais descabida possível. Depois que os cristãos tiveram liberdade de culto, houve, naturalmente, um enorme desenvolvimento de todo tipo. Ao invés do enclausuramento nas catacumbas, os cristãos começaram a construir basílicas esplêndidas. Eles as adornavam com mosaicos caros, esculturas e estátuas, e nelas preservaram as relíquias dos santos mártires. Mas não houve um novo princípio. Os mosaicos representavam mais artisticamente e ricamente os mesmos atos que haviam sido pintados nas paredes das catacumbas antigas, as estátuas maiores continuaram a tradição iniciada nos sarcófagos esculpidos em poucos ornamentos de chumbo e de vidro. Deste momento até a perseguição iconoclasta, as imagens sagradas estavam em posse de todo o mundo cristão.

Sobre o culto as imagens e relíquias assim define o catecismo da Igreja Católica:

O culto cristão das imagens não é contrário ao primeiro mandamento, que proíbe os ídolos. De fato, a hora prestada a uma imagem se dirige ao modelo Original, e quem venera uma imagem venera a pessoa que nela está pintada. A honra prestada às santas imagens é uma ‘veneração respeitosa’, e não uma adoração, que só compete a Deus: Oculto da religião não se dirige às imagens em si como realidades, mas as considera em seu aspecto próprio de imagens que nos conduzem ao Deus encarnado. Ora, o movimento que se dirige à imagem enquanto tal não termina nela, mas tende para a realidade da qual é imagem.”

(CIC 2132)

Também o catecismo proíbe qualquer tipo de adoração ou idolatria a imagens:

“O primeiro mandamento condena o politeísmo. Exige que o homem não acredite em outros deuses afora Deus, que não venere outras divindades afora a única. A escritura lembra constantemente esta rejeição de "ídolos, ouro e prata, obras das mãos dos homens", os quais "têm boca e não falam, têm olhos e não veem...". Esses ídolos vãos tornam as pessoas vãs: "Como eles serão os que o fabricaram e quem quer que ponha neles a sua fé" (Sl 115,4- 5.8). Deus, pelo contrário, é o "Deus vivo" (Jo 3,10) que faz viver e intervém na história.”

(CIC 2112)

O concílio de Trento declara que  veneração não deve ser dirigida a uma imagem diretamente como realidade, pois uma imagem apenas representa:

“Além disso declara este santo concílio, que as imagens devem existir, principalmente nos templos, principalmente as imagens de Cristo, da Virgem Mãe de Deus, e de todos os outros santos, e que a essas imagens deve ser dada a correspondente honra e veneração, não por que se creia que nelas existe divindade ou virtude alguma pela qual mereçam o culto, ou que se lhes deva pedir alguma coisa, ou que se tenha de colocar a confiança nas imagens, como faziam antigamente os gentios, que colocavam suas esperanças nos ídolos, mas sim porque a honra que se dá às imagens, se refere aos originais representados nelas, de modo que adoremos unicamente a Cristo, por meio das imagens que beijamos e em cuja presença nos descobrimos, ajoelhamos e veneramos aos santos, cuja semelhança é espelhada nessas imagens. Tudo isto está estabelecido nos decretos dos concílios, principalmente no segundo de Nicéia, contra os impugnadores das imagens.”

(Concílio de Trento: sessão XXV)

Portanto, tanto os cristãos atuais quanto os antigos não veneravam e honravam as imagens e relíquias sagradas dos mártires e santos em si como realidades, mas a quem as imagens representam, ou seja, ao honrar uma imagem de Cristo ou da Cruz, estamos venerando o próprio Cristo.

As catacumbas primitivas

Depois da partida de Jesus aos céus, os cristãos passaram a ser perseguidos das mais variadas formas. Eram torturados publicamente, lançados ao furor de animais violentos, empalados, crucificados e, até mesmo, queimados vivos. Para redimir e orar pelos seus mártires, os cristãos passaram a enterrá-los nas chamadas catacumbas. Estas funcionavam como túmulos subterrâneos onde os cristãos poderiam fugir dos soldados romanos, entoarem cantos e pintar imagens que manifestavam sua fé. As primeiras catacumbas encontradas são datadas do século II d.C. 

A pintura elaborada no interior das catacumbas era rodeada de uma simbologia que indicava a forte discrição do culto cristão naquele momento. O que mostra que desde o cristianismo primitivo as imagens eram utilizadas pra expressão de fé e devoção. As imagens mais frequentes eram o crucifixo, que lembrava o sacrifício de Jesus. A âncora que significava o ideal de salvação. O peixe era bastante comum, (pois peixe em grego é ICTUS eram as mesmas iniciais de: “Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador”) e diversas passagens bíblicas.

O poeta ibérico cristão, Prudêncio, também lembra que, nos primeiros anos do século V, muitos peregrinos iam para Roma e até mesmo de regiões vizinhas para venerar o túmulo do mártir Hipólito, que foi enterrado nas catacumbas da Via Tiburtina.